STJ: Mãe que tem guarda compartilhada pode mudar de país com o filho

#Direito da Criança e do Adolescente#Direito da Mulher#Direito de Família

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CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA. CONTRADIÇÃO. INCOMPREENSÃO DA TESE RECURSAL À LUZ DAS QUESTÕES DECIDIDAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 284/STF. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES DECIDIDAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO. GUARDA COMPARTILHADA ESTABELECIDA NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS E NÃO IMPUGNADA PELAS PARTES. CARACTERÍSTICAS. DISTINÇÃO COM A GUARDA ALTERNADA E COM O REGIME DE VISITAS OU CONVIVÊNCIA. COMPARTILHAMENTO DE RESPONSABILIDADES INDEPENDENTEMENTE DE CUSTÓDIA FÍSICA OU DIVISÃO IGUALITÁRIA DE TEMPO DE CONVIVÊNCIA. IMPORTÂNCIA DA FIXAÇÃO DE RESISTÊNCIA PRINCIPAL. REFERÊNCIA DE LAR PARA RELAÇÕES. GUARDA COMPARTILHADA QUE É FLEXÍVEL E ADMITE FORMULAÇÃO DIVERSAS, PELAS PARTES CONSENSUALMENTE OU FIXADAS PELO JUIZ. FIXAÇÃO DO LAR DE REFERÊNCIA EM CIDADE, ESTADO OU PAÍS DIFERENTE DE UM DOS GENITORES. POSSIBILIDADE. COMPARTILHAMENTO DE RESPONSABILIDADES QUE PODE SER REALIZADO INDEPENDENTEMENTE DA DISTÂNCIA GEOGRÁFICA. PROTEÇÃO AO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA COM A MODIFICAÇÃO DO LAR DE REFERÊNCIA PARA A HOLANDA, DIANTE DOS BENEFÍCIOS POTENCIAIS DA MEDIDA À CRIANÇA E DO REGIME DE AMPLA CONVIVÊNCIA FIXADO EM 1º GRAU DE JURISDIÇÃO.
1- Ação ajuizada em 07/10/2019. Recurso especial interposto em 13/02/2022 e atribuído à Relatora em 22/08/2022.
2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se há contradição ou omissão relevante no acórdão recorrido; e (ii) se, na guarda compartilhada, é admissível a modificação do lar de referência para país distinto daquele em que reside o outro genitor e se, na hipótese, essa medida atende ao princípio do melhor interesse da criança.
3- Quando a tese de que existiria contradição no acórdão recorrido não está adequadamente fundamentada, aplica-se a Súmula 284/STF por impossibilidade de compreensão da questão controvertida.
4- Não há que se falar em omissão quando o acórdão recorrido, ao examinar a questão suscitada, pronuncia-se sobre a matéria, ainda que contrariamente aos interesses da parte.
5- A guarda compartilhada não se confunde com a guarda alternada, tampouco com o regime de visitas ou de convivência, na medida em que a guarda compartilhada impõe o compartilhamento de responsabilidades, não se confundido com a simples custódia física conjunta da prole ou com a divisão igualitária de tempo de convivência dos filhos com os pais.
6- Diferentemente do que ocorre na guarda alternada, em que há a fixação de dupla residência na qual a prole residirá com cada um dos genitores em determinado período, na guarda compartilhada é possível e desejável que se defina uma residência principal para os filhos, garantindo-lhes uma referência de lar para suas relações da vida.
7- A guarda compartilhada não demanda custódia física conjunta, tampouco implica, necessariamente, em tempo de convívio igualitário, pois, diante de sua flexibilidade, essa modalidade de guarda comporta as fórmulas mais diversas para sua implementação, notadamente para o regime de convivência ou de visitas, a serem fixadas pelo juiz ou por acordo entre as partes em atenção às circunstâncias fáticas de cada família individualmente considerada.
8- É admissível a fixação da guarda compartilhada na hipótese em que os genitores residem em cidades, estados ou, até mesmo, em países diferentes, especialmente porque, com o avanço tecnológico, é plenamente possível que, à distância, os pais compartilhem a responsabilidade sobre a prole, participando ativamente das decisões acerca da vida dos filhos. Precedente.
9- Na hipótese em exame, a alteração do lar de referência da criança, do Brasil para a Holanda, conquanto gere dificuldades e modificações em aspectos substanciais da relação familiar, atende aos seus melhores interesses, na medida em que permitirá a potencial experimentação, desenvolvimento, vivência e crescimento aptos a incrementar a vida da criança sob as perspectivas pessoal, social, cultural, valorativa, educacional e de qualidade de vida em um país que, atualmente, ocupa o décimo lugar no ranking de Índice de Desenvolvimento Humano da ONU.
10- Hipótese em que, ademais, houve o desenvolvimento de um cuidadoso plano de convivência na sentença, em que existe a previsão de retorno da criança ao Brasil em todos os períodos de férias até completar dezoito anos (com custos integralmente suportados pela mãe), utilização ampla e irrestrita de videochamadas ou outros meios tecnológicos de conversação e a convivência diária quando o pai estiver na Holanda.
11- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido, a fim de restabelecer a sentença quanto à admissibilidade da modificação do lar de referência da criança para a Holanda e quanto ao regime de convivência e de visitação do genitor que fora por ela estabelecida, invertendo-se a sucumbência.

(STJ – REsp 2038760 / RJ , Relatora: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 06/12/2022, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/12/2022)

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Direito Dela