TJPR: AÇÃO DE ALIMENTOS: TRABALHO doméstico DE CUIDADO da mãe. CONSIDERAÇÃO NO CÁLCULO DA proprocionalidade dos alimento – adoção do protocolo de julgamento com perspectiva de gênero

#Direito da Criança e do Adolescente#Direito da Mulher#Direito de Família#Direitos Humanos

Compartilhar:

DIREITO DAS FAMÍLIAS. direitos humanos. AÇÃO DE ALIMENTOS C/C REGULAMENTAÇÃO DE
CONVIVÊNCIA. tutela provisória de urgência. DECISÃO recorrida. fixação dos ALIMENTOS
PROVISÓRIOS EM 50% DO SALÁRIO MÍNIMO AOS TRÊS FILHOS MENORES DE IDADE. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. RECURSO INTERPOSTO PELA MÃE. PLEITO DE fixação de ALIMENTOS PROVISÓRIOS
EM 33% DOS RENDIMENTOS LÍQUIDOS DO AGRAVADO. OBSERVÂNCIA DO TRINÔMIO ALIMENTAR
(POSSIBILIDADE-NECESSIDADE-PROPORCIONALIDADE). FILHOS EM IDADE INFANTIL.
NECESSIDADE PRESUMIDA. TRABALHO doméstico DE CUIDADO diário e NÃO REMUNERADO da
mulher. CONSIDERAÇÃO NO CÁLCULO DA proprocionalidade dos alimentos. adoção do protocolo de
julgamento com perspectiva de gênero do conselho nacional de justiça. aplicação do PRINCÍPIO DA
parentaliadade responsável. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.1. A fixação dos alimentos deve
obedecer a uma perspectiva solidária entre pais e filhos, pautada na ética do cuidado e nas noções
constitucionais de cooperação, isonomia e justiça social, uma vez que se trata de direito fundamental
inerente à satisfação das condições mínimas de vida digna, especialmente para crianças e
adolescentes que, em virtude da falta de maturidade física e mental, são seres humanos vulneráveis,
que necessitam de especial proteção jurídica. Exegese dos artigos 3º, inc. I, 6º e 229 da Constituição
Federal, conjugado com os artigos 1.566, inc. IV, 1.694 e 1.696 do Código Civil, e 22 do Estatuto da
Criança e do Adolescente. Preâmbulo da Convenção sobre os Direitos da Criança da Organização das
Nações Unidas, Recomendação nº 123/2022 do Conselho Nacional de Justiça e Precedente da Corte
Interamericana de Direitos Humanos – Caso de los “Niños de la Calle” (Villagrán Morales y otros) Vs.
Guatemala (1999).2. O arbitramento judicial dos alimentos, devidos pelos pais para a manutenção dos
filhos, deve observar a equação necessidades do alimentado, capacidade financeira ou possibilidade
econômica dos alimentantes e a proporcionalidade dos recursos de cada genitor. Exegese dos artigos
1.566, inc. IV, 1.694, § 1º, e 1.703 do Código Civil.3. Pela concepção finalística (e não institucional) e
eudemonista, adotada na Constituição Federal de 1988, a família, como refúgio afetivo, é um meio de
proteção dos direitos humanos-fundamentais, um instrumento à serviço da promoção da dignidade e
do desenvolvimento humano, baseado no respeito mútuo, na igualdade e na autodeterminação
individual, devendo assegurar a realização pessoal e a busca da felicidade possível aos seus
integrantes. Interpretação do artigo 226, § 8º, 1ª parte, da Constituição Federal.
4. As relações familiares, porque marcadas pelo princípio da afetividade e sua manifestação pública
(socioafetividade), devem estar estruturadas no dever jurídico do cuidado (que decorre, por exemplo,
da liberalidade de gerar ou de adotar filhos) e na ética da responsabilidade (que, diferentemente da
ética da convicção, valida comportamentos pelos resultados, não pela mera intenção) e da alteridade
(que se estabelece no vínculo entre o “eu” e o “outro”, em que aquele é responsável pelo cuidado
deste, enquanto forma de superação de egoísmos e narcisismos, causadores de todas as formas de
situações de desentendimentos, intolerância, discriminações, riscos e violências, que trazem
consequências nocivas principalmente para os seres humanos mais vulneráveis, como crianças,
adolescentes, pessoas com deficiência, meninas/mulheres e idosos). Incidência dos artigos 229 da
Constituição Federal e 1634, inc. I, e 1.694 do Código Civil. Precedentes do Supremo Tribunal Federal
e do Superior Tribunal de Justiça. Literatura jurídica.
5. Quando os filhos em idade infantil residem com a mãe, as atividades domésticas, inerentes ao
dever diário de cuidado (como o preparo do alimento, a correção das tarefas escolares, a limpeza da
casa para propiciar um ambiente limpo e saudável) – por exigirem uma disponibilidade de tempo
maior da mulher, sobrecarga que lhe retira oportunidades no mercado de trabalho, no
aperfeiçoamento cultural e na vida pública – devem ser consideradas, contabilizadas e valoradas, para
fins de aplicação do princípio da proporcionalidade, no cálculo dos alimentos, uma vez que são
indispensáveis à satisfação das necessidades, bem-estar e desenvolvimento integral (físico, mental,
moral, espiritual e social) da criança. Inteligência dos artigos 1º e 3º, caput, do Estatuto da Criança e
do Adolescente (Lei 8.069/90) c/c artigo 3.2 da Convenção sobre os Direitos da Criança da
Organização das Nações Unidas.
6. O princípio da parentalidade responsável (artigo 226, § 7º, da Constituição Federal) – concretizado
por meio do pagamento de alimentos fixados em montante proporcional aos esforços da mulher, com
a realização de trabalhos domésticos e diários na educação da criança – é um instrumento de
desconstrução da neutralidade epistêmica e superação histórica de diferenças de gêneros, de
identificação de estereótipos presentes na cultura que comprometem a imparcialidade jurídica, de
promoção da equidade do dever de cuidado de pai e mãe no âmbito familiar, além de ser um meio de
promoção de direitos humanos e de justiça social (artigos 4º, inc. II, e 170, caput, da Constituição
Federal).
7. A presunção das necessidades de crianças e adolescentes à percepção de alimentos é uma técnica
processual de facilitação da prova e de persuasão racional do juiz na promoção dos direitos
fundamentais, para o desenvolvimento humano integral. Interpretação do artigo 373, inc. I, do Código
de Processo Civil em conformidade com os artigos 5º, inc. XXXV e § 2º, da Constituição Federal, 4º da
Convenção dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU) e 19 da Convenção
Americana de Direitos Humanos.8. A análise do montante ideal da pensão alimentícia, em relação às
reais necessidades dos alimentandos, as condições econômicas do alimentante e a distribuição
proporcional dos ônus financeiros decorrentes da paternidade/maternidade responsável, pode ser
examinada em um momento processual futuro, diante do aprofundamento da discussão pelo exercício
efetivo do contraditório e da ampla defesa, quando da confrontação pelo juiz, em decisão
interlocutória posterior ou na sentença, da suficiência de argumentos e provas. Precedente do
Superior Tribunal de Justiça.9. Recurso conhecido e provido, para readequar o valor da prestação
alimentícia para o correspondente a 33% dos rendimentos líquidos do alimentante (salário bruto,
excluídos apenas os descontos obrigatórios), aí incluídos valores referentes a férias, 13º salário e
adicionais permanentes.

[TJPR – 12ª Câmara Cível – 0013506-22.2023.8.16.0000 – Rio Branco do Sul – Rel.: EDUARDO AUGUSTO SALOMAO CAMBI – J. 02.10.2023]

Escrito por:

Direito Dela