Servidor estadual e municipal responsável por pessoa com TEA tem direito a jornada reduzida

#Direito do Trabalho#Maternidade#Pessoa com deficiência

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. TRATADO EQUIVALENTE À EMENDA CONSTITUCIONAL . PROTEÇÃO INTEGRAL E PRIORITÁRIA À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. LEI 12.764/2012. POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA . PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA DA FAMÍLIA DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM ALTERAÇÃO NOS VENCIMENTOS. SERVIDORA ESTADUAL CUIDADORA DE FILHO AUTISTA. INEXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESTADUAL . ANALOGIA AO ART. 98, § 3º, DA LEI 8.112/1990. LEGITIMIDADE DA APLICAÇÃO DE LEGISLAÇÃO FEDERAL QUANDO A OMISSÃO ESTADUAL OU MUNICIPAL OFENDE DETERMINAÇÃO CONSTITUCIONAL AUTOAPLICÁVEL QUE NÃO ACARRETE AUMENTO DE GASTOS AO ERÁRIO . PRINCÍPIO DA IGUALDADE SUBSTANCIAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. FIXAÇÃO DE TESE DE REPERCUSSÃO GERAL.

I – A Carta Política de 1988 fixou a proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, cujas garantias têm sido reiteradamente positivadas em nossa legislação, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/1990) e da promulgação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (Decreto 99 .170/1990).

II – A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, no § 2º do art. 1º da Lei 12.764/2012, estipulou que eles são considerados pessoas com deficiência, para todos os efeitos legais . Assim, é incontestável que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência aplicam-se também a eles.

III – A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) foi assinada pelo Brasil e, por ter sido aprovada de acordo com os ritos previstos no art. 5º, § 3º da Constituição Federal de 1988, suas regras são equivalentes a emendas constitucionais, o que reforça o compromisso internacional assumido pelo País na defesa dos direitos e garantias das pessoas com deficiência.

IV – A CDPD tem como princípio geral o “respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua identidade” (art . 3º, h) e determina que, nas ações relativas àquelas com deficiência, o superior interesse dela receberá consideração primordial (art. 7º, 2).

V – No Preâmbulo (item X), o Tratado é claro ao estabelecer que a família, núcleo natural e fundamental da sociedade, tem o direito de receber não apenas a proteção de todos, mas também a assistência necessária para torná-la capaz de contribuir para o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência.

VI – Os Estados signatários obrigam-se a “adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção” (art . 4º, a).

VII – A omissão do Poder Público, portanto, não pode justificar afronta às diretrizes e garantias constitucionais. Assim, a inexistência de lei estadual específica que preveja a redução da jornada de servidores públicos que tenham filhos com deficiência, sem redução de vencimentos, não serve de escusa para impedir que seja reconhecido a elas e aos seus genitores o direito à dignidade da pessoa humana e o direito à saúde.

VIII – A convivência e acompanhamento familiar para o desenvolvimento e a inclusão das pessoas com deficiência são garantidos pelas normas constitucionais, internacionais e infraconstitucionais, portanto, deve-se aplicar o melhor direito em favor da pessoa com deficiência e de seus cuidadores .

IX – O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu que é legítima a aplicação da Lei 8.112/1990 nos casos em que a legislação estatal e municipal for omissa em relação à determinação constitucional autoaplicável que não gere aumento ao erário. Precedentes.

X – Tendo em vista o princípio da igualdade substancial, previsto tanto em nossa Carta Constitucional quanto na Convenção Internacional sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, se os servidores públicos federais, pais ou cuidadores legais de pessoas com deficiência têm o direito a horário especial, sem a necessidade de compensação de horário e sem redução de vencimentos, os servidores públicos estaduais e municipais em situações análogas também devem ter a mesma prerrogativa .

XI – Recurso extraordinário a que se dá provimento. Fixação de tese: “Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, § 2º e § 3º, da Lei 8.112/1990” .

(STF – RE: 1237867 SP, Relator.: RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 17/12/2022, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-003 DIVULG 11-01-2023 PUBLIC 12-01-2023)

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Direito Dela