Tempo de leitura: 14 MIN

MULHERES NA POLÍTICA

#Direito Constitucional#Direito da Mulher#Direito Eleitoral#Direitos Humanos

Compartilhar:

O direito ao voto e a possibilidade de candidatura são formas de exercício da cidadania; uma pessoa que não pode exercê-la não usufrui dos seus direitos políticos, logo não faz parte da sociedade enquanto alguém que pode deliberar sobre o futuro desta. Só com estes direitos é possível alcançar a representatividade e efetivar os direitos da mulher, pois é utópico pensar que os homens irão lutar pelos nossos direitos. Alguns deles podem até ter uma boa intenção, mas só quem vai buscar ferrenhamente é quem sente na pele; tanto que o próprio direito ao voto e outros diversos direitos das mulheres só foram alcançados após muita luta FEMININA.

Trazendo um pouquinho de história para retratar a necessidade do protagonismo feminino na política é essencial mencionar a cientista Isabel de Souza Mattos que exigiu na Justiça em 1880 o direito ao voto; o Partido Republicano Feminino, criado em 1910 pela professora Leolinda de Figueiredo Daltro na luta pelo voto feminino; a Liga pela Emancipação Intelectual da Mulher (posteriormente chamado de Federação Brasileira pelo Progresso Feminino) criada em 1920 por Bertha Lutz, um dos maiores nomes na luta pelos direitos das mulheres no nosso país; somadas a estas Celina Guimarães, Alzira Soriano e, claro, todas a mulheres que integraram o Lobby do Batom, além das 26 constituintes de 1987/1988.

Com mais mulheres em cargos públicos a principal mudança é a realização de políticas públicas, elaboração de leis e gestão com a perspectiva de gênero, buscando a equidade, colocando pautas femininas dentro do executivo, do legislativo e do judiciário.

O obstáculo? O que sempre enfrentamos: estruturas patriarcais. Existem muitas candidatas sensacionais, capacitadas, com propostas essenciais para a sociedade e para a causa das mulheres, mas a cultura machista de que a política é coisa para homem faz com que os partidos não apostem nelas. A própria ‘’cota’’ de gênero de 30% (que impõe que cada partido indique o mínimo de 30% de candidatas mulheres) só foi aplicada de forma efetiva nas últimas eleições municipais (2020). Antes disso, mesmo já havendo a previsão da cota, os partidos burlavam através de coligações e direcionamento irrisório do fundo eleitoral para as candidatas.

Para além dos partidos, discutir o feminismo é necessário para que possamos desconstruir estigmas de gênero e, assim, construir uma sociedade com respeito e equidade. É essencial para a efetivação da dignidade da pessoa humana que tenhamos mulheres à frente da política, na medida em que a atuação em um cargo político é uma das formas mais efetivas de deliberar sobre o futuro da sociedade.

Jacqueline Pitanguy que participou ativamente do Lobby do Batom à frente da luta pela participação feminina na Constituinte de 1987, com muita propriedade afirmou:

Nós, mulheres, estamos conscientes de que este país só será verdadeiramente democrático e seus cidadãos verdadeiramente livres quando, sem prejuízo de sexo, raça, cor, classe, orientação sexual, credo  político ou religioso, condição física ou idade, for garantido tratamento e igual oportunidade de acesso às  ruas, palanques, oficinas, fábricas, escritórios, assembleias e palácios”.

 

VIOLÊNCIA POLÍTICA

A violência política sempre foi uma realidade, mas seu aumento se deu após as eleições de 2018, com a ascensão de políticos de extrema-direita combinado com o fato de representantes de grupos historicamente discriminados passarem a ocupar cargos políticos.

Este tipo de violência coloca em risco e compromete a integridade da democracia, porque substitui os meios democráticos, o diálogo, a interação e o respeito, pela violência; Não acontece somente contra mulheres, mas estas são 76% das vítimas.

Atos de agressão, ameaças, insultos e até assassinatos e atentados têm se tornado cada vez mais comuns no Brasil; o caso Marielle Franco se tornou um exemplo triste e emblemático disto.

Lembramos que dentro da violência política há diferenças entre os ataques recebidos: as mulheres são atacadas pelo que supostamente são, enquanto homens são ofendidos por trabalhos ou posicionamentos. Reflexo da visão machista de que mulheres não está preparadas para liderar processos políticos.

Uma situação de violência política comum é a de duvidar da capacidade de uma mulher, a levar ao stress e depois a desqualificar afirmando que ela é “louca”, “exagerada” ou “descontrolada”. Esta situação é conhecida como gaslighting que, de uma forma simplista, seria um tipo de abuso que objetiva manipular psicologicamente uma mulher para controlá-la, anulá-la ou fazer com que esta duvide da sua competência, percepção das coisas ou até de sua sanidade. O gaslighting é uma realidade enfrentada por mulheres seja no trabalho, dentro de um relacionamento ou até na mesa de bar.

 

É CRIME!

No último ano a Lei nº 14.192/21 trouxe regras para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher alterando o Código Eleitoral (Lei 4.73/65), a Lei dos Partidos políticos (Lei 9.096/95) e a Lei das eleições (Lei 9.504/97).

Entre as ações previstas no texto da Lei, estão a criminalização de abusos e a determinação de que o enfrentamento à violência política contra as mulheres faça parte dos estatutos partidários.

Agora é considerada violência política contra as mulheres toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos delas, não apenas durante as eleições, mas no exercício de qualquer função política ou pública. Também serão punidas práticas que depreciem a condição da mulher ou estimule sua discriminação em razão do sexo feminino ou em relação a cor, raça ou etnia.

Assim como a violência doméstica, a violência política pode incluir violência física, psicológica, simbólica, sexual, patrimonial, moral ou feminicida, com o objetivo principal de diminuir ou anular direitos político-eleitorais das mulheres.

Um bom exemplo disso são os ataques verbais que exploram a sexualidade das mulheres e suas características físicas, como forma de desqualificá-las publicamente. Também não são raros relatos de mulheres públicas que sofreram ameaças, especialmente de estupro e violência física.

O aumento da participação e representação política de mulheres é acompanhado por um aumento sistemático de violência contra elas. Esta lei vem para marcar um grande passo na luta das mulheres!

 

LEIA! Carta das Mulheres aos Constituintes de 1987: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/Constituicoes_Brasileiras/constituicao-cidada/a-constituinte-e-as-mulheres/arquivos/Constituinte%201987-1988-Carta%20das%20Mulheres%20aos%20Constituintes.pdf

 

Está passando ou passou por alguma destas situações? Precisa de uma advogada? Encontre uma próxima a você na nossa página inicial.

 

Referências bibliográficas:

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ Constituiçao.htm. Acesso em: 22 mar. 2022.

SILVA, Daniel Neves. “Voto feminino no Brasil”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/voto-feminino-no-brasil.htm. Acesso em 22 de março de 2022.

INSTITUTO IGARAPÉ. Rio de Janeiro. Violência Política Contra Mulheres. Disponível em: https://eva.igarape.org.br/politicalViolence. Acesso em 09 de março de 2022.

AGÊNCIA SENADO. Brasília, 2021. Sancionada lei para combater violência política contra a mulher. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/08/05/sancionada-lei-para-combater-violencia-politica-contra-a-mulher. Acesso em 09 de março de 2022.

 

Escrito por:

Camila Rufato Duarte

Fundadora do Direito Dela