ACÓRDÃO – ALVARÁ JUDICIAL – TRANSFERÊNCIA DE VEÍCULO PARA ÚNICO HERDEIRO – PROVIMENTO

#Direito das Sucessões#Direito de Família#Direito do Idoso

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Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

Vigésima Câmara Cível

Apelação Cível n.º 0003981-46.2021.8.19.0212

Apelante: xxxxxxxxxxxxxx

Relatora: Desembargadora Conceição A. Mousnier

 

Pedido de expedição de alvará judicial para transferência de veículo do falecido genitor. Sentença de indeferimento

da petição inicial por inadequação da via eleita, nos termos do artigo 485, incisos I e VI, do NCPC. Inconformismo do

Requerente. Entendimento desta Relatora quanto à necessidade de anulação da sentença vergastada. Cuida-

se de pedido de alvará judicial para transferência de um veículo Ford/Fiesta/GL, ano 2001, placa MTM5777-RJ, único

bem deixando pelo genitor do Requerente, Sr. Almir Fontes, falecido em 16/12/2018. Neste passo, conforme preconizado

no artigo 666 do NCPC, o pagamento dos valores previstos na Lei n.º 6.858/1980 não depende de inventário ou de

arrolamento, bastando o pedido de alvará judicial.

 

Ademais, a Lei 6.858/1980 dispõe sobre o pagamento aos dependentes e sucessores de valores não superiores a 500

ORTNs, não recebidos em vida pelos titulares, por meio de simples pedido de alvará judicial, independentemente de

abertura de inventário ou arrolamento. Não obstante, os citados artigos referirem-se apenas ao pagamento de valores, a jurisprudência tem entendimento acerca da possibilidade de mitigação do disposto no artigo 666 do NCPC, a fim de permitir a expedição de alvará para transferência de veículo de baixo valor (inferior 500 ORTNs) desde que não haja outros bens a inventariar e todos os herdeiros sejam maiores e capazes. Sendo assim, o juiz ao analisar o caso, em observância aos princípios da celeridade e economia processual, os fins sociais das citadas normas e, por se tratar de procedimento de

jurisdição voluntária, pode adotar a solução mais eficiente e oportuna, conforme autorizado pelo § único do artigo 723

do NCPC. Na presente hipótese, o Requerente é filho único, não há outros herdeiros, e o de cujus deixou tão somente o

veículo supracitado, cujo valor, segundo a Tabela FIPE, é de aproximadamente R$ 8.819,00. Portanto, estão presentes as

condições que viabilizam a mitigação das hipóteses previstas no artigo 666 do NCPC, sendo possível a transferência do veículo por meio de alvará judicial. Desse modo, não há que se falar em inadequação da via eleita, razão pela qual a Sentença que indeferiu a inicial deve ser anulada, para prosseguimento, com as intimações e diligências cabíveis. Precedentes do E. TJERJ.

 

CONHECIMENTO E PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO PARA ANULAR A SENTENÇA, determinando-se o

prosseguimento do feito.

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível n.º 0003981-46.2021.8.19.0212, em que figura como Apelante, ARY ALFREDO PEREIRA FORTES (Autor),

 

A C O R D A M os Desembargadores que compõem a Colenda Vigésima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em VOTAÇÃO UNÂNIME, em CONHECER E DAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO, nos termos do Voto da Relatora.

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de pedido de expedição de alvará judicial, pretendendo o Requerente a adjudicação do bem móvel de seu falecido genitor (automóvel), com a expedição de ofício ao DETRAN, compelindo- o a transferir o bem para a sua propriedade.

 

A Sentença de fls. 30/31 indeferiu a petição inicial por inadequação da via eleita, nos termos do artigo 485, incisos I e VI, do

NCPC. Houve condenação do Requerente ao pagamento das custas processuais, sendo-lhe deferida a gratuidade de justiça.

 

Inconformado, o Requerente interpôs recurso de apelação de fls. 40/44, tempestivo e livre de preparo (fl. 45), sustentando,

em síntese, que a jurisprudência dominante tem flexibilizado a taxatividade da hipótese do artigo 666 do NCPC, em atenção a celeridade e economia processual, autorizando que a transferência de veículo seja realizada por alvará judicial. Ressalta tratar-se de bem de pequeno valor.

 

Posto isso, requer a nulidade da sentença ou a sua reforma, para que seja julgado procedente o pedido de expedição do respectivo alvará, sem a necessidade de abertura de inventário ou arrolamento.

 

Sem contrarrazões – fl. 47.

 

V O T O

 

Cuida-se de pedido de alvará judicial para transferência de um veículo Ford/Fiesta/GL, ano 2001, placa MTM5777-RJ,

único bem deixando pelo genitor do Requerente, Sr. Almir Fontes, falecido em 16/12/2018.

 

Neste passo, conforme preconizado no artigo 666 do NCPC, o pagamento dos valores previstos na Lei n.º 6.858/1980 não

depende de inventário ou de arrolamento, bastando o pedido de alvará judicial.

 

Ademais, a Lei 6.858/1980 dispõe sobre o pagamento aos dependentes e sucessores de valores não superiores a 500 ORTNs, não recebidos em vida pelos titulares, por meio de simples pedido de alvará judicial, independentemente de abertura de inventário ou arrolamento.

 

ART. 1º – OS VALORES DEVIDOS PELOS EMPREGADORES AOS EMPREGADOS E OS MONTANTES DAS CONTAS INDIVIDUAIS DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO E DO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO PIS-PASEP, NÃO RECEBIDOS EM VIDA PELOS RESPECTIVOS TITULARES, SERÃO PAGOS, EM QUOTAS IGUAIS, AOS DEPENDENTES

HABILITADOS PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL OU NA FORMA DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA DOS SERVIDORES CIVIS E MILITARES, E, NA SUA FALTA, AOS SUCESSORES PREVISTOS NA LEI CIVIL, INDICADOS EM ALVARÁ JUDICIAL, INDEPENDENTEMENTE DE INVENTÁRIO OU ARROLAMENTO.

§(…)

ART. 2º O DISPOSTO NESTA LEI SE APLICA ÀS RESTITUIÇÕES RELATIVAS AO IMPOSTO DE RENDA E OUTROS TRIBUTOS, RECOLHIDOS POR PESSOA FÍSICA, E, NÃO EXISTINDO OUTROS BENS SUJEITOS A INVENTÁRIO, AOS SALDOS BANCÁRIOS E DE CONTAS DE CADERNETAS DE POUPANÇA E FUNDOS DE INVESTIMENTO DE VALOR ATÉ 500 (QUINHENTAS) OBRIGAÇÕES REAJUSTÁVEIS DO TESOURO NACIONAL.

 

Não obstante, os citados artigos referirem-se apenas ao pagamento de valores, a jurisprudência tem entendimento acerca da possibilidade de mitigação do disposto no artigo 666 do NCPC, a fim de permitir a expedição de alvará para transferência de veículo de baixo valor (inferior 500 ORTNs) desde que não haja outros bens a inventariar e todos os herdeiros sejam maiores e capazes.

 

Sendo assim, o juiz ao analisar o caso, em observância aos princípios da celeridade e economia processual, os fins sociais das citadas normas e, por se tratar de procedimento de jurisdição voluntária, pode adotar a solução mais eficiente e oportuna, conforme autorizado pelo § único do artigo 723 do NCPC:

 

“ART. 723. O JUIZ DECIDIRÁ O PEDIDO NO PRAZO DE 10 (DEZ) DIAS. PARÁGRAFO ÚNICO. O JUIZ NÃO É OBRIGADO A OBSERVAR CRITÉRIO DE LEGALIDADE ESTRITA, PODENDO ADOTAR EM CADA CASO A SOLUÇÃO QUE CONSIDERAR MAIS CONVENIENTE OU OPORTUNA.”

 

Na presente hipótese, o Requerente é filho único, não há outros herdeiros, e o de cujus deixou tão somente o veículo

supracitado, cujo valor, segundo a Tabela FIPE, é de aproximadamente R$ 8.819,00. Mês de referência: agosto de 2022

Código Fipe: 003143-7 Marca: Ford Modelo: Fiesta GL 1.0 3p Ano Modelo: 2001 Gasolina Autenticação cdpcrwmckmbc

Data da consulta segunda-feira, 15 de agosto de 2022 18:47 Preço Médio R$ 8.819,00

 

Portanto, estão presentes as condições que viabilizam a mitigação das hipóteses previstas no artigo 666 do NCPC, sendo possível a transferência do veículo por meio de alvará judicial.

 

Desse modo, não há que se falar em inadequação da via eleita, razão pela qual a Sentença que indeferiu a inicial deve ser

anulada, para prosseguimento, com as intimações e diligências cabíveis.

 

Aliás, os entendimentos supracitados encontram amparo no ementário de jurisprudência deste E. Tribunal de Justiça:

 

APELAÇÃO CÍVEL. ALVARÁ JUDICIAL. DEMANDA AJUIZADA PELOS FILHOS DO DE CUJUS REQUERENDO A TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE DE VEÍCULO FABRICADO EM 2013, DE PEQUENO VALOR POR ELE DEIXADO. O PROCESSO FOI EXTINTO POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. A MENS LEGIS DA LEI N° 6.858/80 É NO SENTIDO DE PERMITIR A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ JUDICIAL PARA LEVANTAMENTO DE PEQUENOS VALORES, COMO SE AFIGURA O BEM OBJETO DO PEDIDO. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. SENTENÇA QUE SE CASSA PARA QUE HAJA O PROSSEGUIMENTO DO FEITO COM INTIMAÇÃO DA FAZENDA PARA SE PRONUNCIAR SOBRE A INCIDÊNCIA OU NÃO DE IMPOSTO DE TRANSMISSÃO MORTIS CAUSA NA HIPÓTESE. PROVIMENTO DO RECURSO PARA CASSAR A SENTENÇA.

(0004214-85.2021.8.19.0004 – APELAÇÃO. DES(A). LEILA MARIA RODRIGUES PINTO DE CARVALHO E ALBUQUERQUE – JULGAMENTO: 17/11/2021 – VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL)

 

PROCESSUAL CIVIL. REQUERIMENTO DE ALVARÁ PARA VENDA DE VEÍCULO AUTOMOTOR. LEI Nº 6.858/1980. APLICABILIDADE. TRATA-SE DE REFERÊNCIA PARA APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ JUDICIAL, CUJA INTERPRETAÇÃO DEVE ABARCAR BENS NESSE PATAMAR, DE MODO A EVITAR BUROCRACIA E PROCEDIMENTOS

DESNECESSÁRIOS. CONSIDERANDO QUE A UFIR DE 2018 EQUIVALE A R$ 3,2939 (RESOLUÇÃO SEFAZ 178/2017), O LIMITE PARA LEVANTAMENTO DE VALORES MEDIANTE ALVARÁ JUDICIAL CORRESPONDE A R$ 10.161,68 (DEZ MIL, CENTO E SESSENTA E UM REAIS E SESSENTA E OITO CENTAVOS). TENDO EM VISTA QUE O VALOR APROXIMADO DO

VEÍCULO SEQUER PODERÁ ALCANÇAR O MONTANTE DE R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS, AO QUE TUDO INDICA, OU SEJA, INFERIOR AO LIMITE ESTABELECIDO NO ARTIGO 2º DA LEI Nº 6.858/1980, SE APRESENTA RAZOÁVEL A LIBERAÇÃO DE VENDA DO VEÍCULO EM FAVOR DA ESPOSA E DOS FILHOS DO FALECIDA. RECURSO PROVIDO. (TJ-RJ – AI:

00706224120198190000, RELATOR: DES(A). CARLOS EDUARDO MOREIRA DA SILVA, DATA DE JULGAMENTO: 04/02/2020, VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL).

 

APELAÇÃO CÍVEL. ALVARÁ JUDICIAL. AUTORIZAÇÂO PARA VENDA DE AUTOMÓVEL. PEDIDO FORMULADO PELA VIÚVA, COM A CONCORDÂNCIA DAS DUAS FILHAS MAIORES E CAPAZES. ÚNICO BEM DEIXADO PELO FALECIDO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO QUE SE ANULA. PROSSEGUIMENTO DO FEITO. PROVIMENTO DO RECURSO. (TJ-RJ – APL:

00142975920188190007, RELATOR: DES(A). JOSÉ CARLOS MALDONADO DE CARVALHO, DATA DE JULGAMENTO: 21/01/2020, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL) APELAÇÃO CÍVEL. REQUERIMENTO DE ALVARÁ JUDICIAL PARA TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE DE VEÍCULO JUNTO AO DETRAN, EM VIRTUDE DO FALECIMENTO DO PROPRIETÁRIO, O QUAL É FORMULADO POR SUA ESPOSA, ÚNICA HERDEIRA, CONSIDERANDO A RENÚNCIA DOS FILHOS DO CASAL. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM ANÁLISE DO MÉRITO, POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, ENTENDENDO O JUÍZO A

QUO PELA NECESSIDADE DE FORMULAÇÃO DE PEDIDO DE ADJUDICAÇÃO DOS BENS, NA FORMA DE ARROLAMENTO SUMÁRIO, NOS TERMOS DO ARTIGO 659, § 1º, DO NCPC. APELO DA PARTE AUTORA. ÚNICO BEM DEIXADO PELO DE CUJUS. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO NOS CASOS PREVISTOS NO ART. 666 DO CPC C/C ART.

1º DA LEI 6.858, DE 24 DE NOVEMBRO DE 1980, QUAIS SEJAM, PAGAMENTO DE “VALORES DEVIDOS PELOS EMPREGADORES AOS EMPREGADOS E OS MONTANTES DAS CONTAS INDIVIDUAIS DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO E DO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO PIS- PASEP, NÃO RECEBIDOS EM VIDA PELOS RESPECTIVOS TITULARES”, BEM COMO EM HIPÓTESES EM QUE O PATRIMÔNIO É POUCO EXPRESSIVO, COMO NO CASO EM COMENTO, CONFORME ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, CONSOANTE ART. 722 DO CPC, QUE DISPÕE QUE “A FAZENDA PÚBLICA SERÁ SEMPRE OUVIDA NOS CASOS EM QUE TIVER INTERESSE”. ESTADO QUE DEVERÁ PROCEDER À AVALIAÇÃO DO VEÍCULO PARA EVENTUALMENTE

CONCEDER A ISENÇÃO DO IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS, CONFORME ART. 3º, VIII, DA LEI ESTADUAL Nº 1427/89, QUE “INSTITUI O IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO”CAUSA MORTIS”E POR DOAÇÃO, DE QUAISQUER BENS OU DIREITOS”, OU DETERMINAR A SUA INCIDÊNCIA, CASO EM QUE A PARTE AUTORA DEVERÁ PAGAR O RESPECTIVO IMPOSTO ANTES DE OBTER O ALVARÁ JUDICIAL. PRECEDENTES. ERROR IN PROCEDENDO. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO PREJUDICADO. (TJ-RJ – APL: 00045696620198190004, RELATOR: DES(A). SANDRA SANTARÉM CARDINALI, DATA DE JULGAMENTO: 19/06/2019, VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL)

 

Posto isso, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO PARA ANULAR A SENTENÇA, determinando-se o prosseguimento do feito.

 

Escrito por:

Jessica Mendonça Aleixo

A nobreza da advocacia se dá na defesa dos vulneráveis!

1 Comentário

  1. parabéns pela publicação. muito esclarecedor este julgado, tirando qualquer dúvida ainda existente entre alguns juizes que contiunam levando ao “pé da letra” o que dispõe a Lei 6.858/1980